Do Livro para a Telona III

, em sexta-feira, 16 de março de 2012 ,
Depois da minha resenha sobre o filme de Eragon (ainda choro lágrimas de vergonha alheia), nossos caros leitores devem ter percebido que esta que vos fala é meio desconfiada com o sistema livros-que-viraram filmes. Não que seja uma fanática que gostaria que a indústria de cinema deixasse os livros socados em suas prateleiras, acumulando poeira - na-na-ni-na-não.


Existem livros que eu só sei que são livros porque viraram filmes ("O Exterminador do Futuro", fiquei muito chocada com a descoberta). Existem livros cujos filmes conseguem fazer jus à obra (como "O Senhor dos Anéis", apesar das adaptações titânicas). E existem livros que nasceram para virar filmes; onde os produtores do cinema conseguem capturar toda a essência da história original, multiplicá-la, e usar todo os elementos diretos do vídeo - vozes, ruídos, música, imagens, cores - para tornar o resultado final algo muito além da imaginação individual do criador.

É nesse último quesito que classifico o filme "Como Treinar o seu Dragão". É bom assim.


Alguns pontos a serem esclarecidos antes da autora começar a babar e mimar esta obra prima da Dreamworks: 1. Eu li, sim, o livro "Como Treinar o seu Dragão", da Cressida Cowell, antes de assistir o filme. Posso falar com sinceridade e propriedade que já conhecia o início da saga de Soluço e dos vikings sem noção de Berk antes de ver a versão em 3D deles. O livro é uma coisa fofa e cativante, aliás. A sinceridade dos protagonistas conquista, mesmo que a obra seja puramente infantil. Se é que uma história tão trançada em sarcasmo pode ser considerada dessa forma. Enfim, resumindo, tinha minhas expectativas literárias quando assisti a esse negócio. 2. Geralmente começo a espernear no cinema quando o filme não sai exatamente como eu imaginei, ou quando os roteiristas acham que não vai fazer diferença se, sei lá, os olhos do Harry Potter forem AZUIS e não VERDES, né, porque não é como se isso não fosse repetido trezentas milhões de vezes em todos os livros.

Dito isso, "Como Treinar o seu Dragão" foi o único filme que pegou um livro do qual eu gostava, mudou uma porrada de coisas, e ao invés de me fazer passar o filme resmungando "que diabo é isso", "não é assiiiiim", "minha nossa senhora da traça de livro, como essa mulher deixa fazerem isso com o livro dela, maldito capitalismo", fez eu passar o filme com um sorriso e, em alguns momentos, quase chorando.

Vou mais longe: "Como Treinar o seu Dragão" foi uma versão fofinha do que "Eragon" devia ter sido. Meaow, é isso aí.

O QUE MUDOU

A Dreamworks, em um golpe de genialidade, acertou exatamente em o que não deveria mexer para evitar descaracterizar a história. Foi que nem a plástica da Megan Fox, sabe? A moça já era bonita, mas o Projeto Angelina Jolie foi muito bem sucedido.

A mudança mais óbvia, e que talvez cause mais desconfiança por parte dos fãs xiitas, é o Banguela. Quem leu o livro sabe que o Banguela original era um dragão pequeno, mirrado, covarde e COMUM. E banguela. Já o Banguela do filme é um Fúria da Noite (nome da raça), um dragão tão rápido e esperto, tão impressivo, que os vikings de Berk sequer têm um registro dele em seu bestiário dracônico. E não é banguela - pelo menos não o tempo todo.

Outra mudança importante é o fato dos dragões não "falarem" com o Soluço que, no livro, é um notório falador (e entendedor) de "dragonês".

Mas isso não atrapalhou em nada, sério, NADA do encanto da adaptação. A falta de discurso verbal do Banguela e dos outros dragões deu lugar à sutileza de movimento, atitude e expressão por parte dos bichos que jamais poderia ser reproduzida em um livro. Ao mesmo tempo, Soluço tornou-se duplamente sarcástico para suprir a ausência das conversas ferinas e espirituosas que o dragãozinho cospe a guisa de fogo o tempo inteiro no livro. E é assim que a dinâmica dos dois personagens principais adquire equilíbrio perfeito ao longo da história.

Aliás, essa adaptação, ao meu ver, era muito necessária. Por mais que seja importante contar a história de superação do meninozinho magricela com um dragãozinho que mais parece uma lagartixa inofensiva, essa só teria o mesmo sentido que teve no livro se a história seguisse o enredo da mestra Conwell passo a passo. E por mais que "Como Treinar o seu Dragão" (o livro) seja breve, o livro permite um insight nos personagens próprio de narração em primeira pessoa, e também foca bastante no grupinho de garotos que acompanha Soluço em sua busca por um dragão. Um filme não poderia passar a delicadeza da situação do garoto se fosse focar em tudo o que a história original mostra ser relevante, e por isso a adaptação foi muito feliz.
A Astrid também foi um acréscimo do filme que fez muito bem ao enredo. Apesar de função primária como interesse amoroso do personagem principal (humano), ela também foi o estopim do conflito e do clímax da história. O filme fluiu melhor por causa dela, mesmo que ela tenha caído de para-quedas nesse roteiro.

Resumindo: os roteiristas remendaram a história toda de forma que o filme focasse quase completamente na relação entre um menino e seu dragão, motivo pelo qual eu e milhares de outras pessoas ficamos de coração derretido ao assistir.

O MENINO E O DRAGÃO

Em toda história medieval/mágica/wtv que tenha dragões bonzinhos - ou pelo menos dispostos a não comer todos os seres vivos menores do que eles - eu fico esperando um efeito "Eragon" transcorrer. Não sei se é algo no meu DNA que gostaria de ter um dragão de estimação, ou se é uma vontade que surgiu desde que eu assisti "Coração de Dragão" pela primeira vez na Sessão da Tarde: um laço forte de afeto, amizade, codependência, o que seja, entre um ser mitológico tão majestoso como um dragão e um simples ser humano. Chamo isso de efeito "Eragon" porque essa é basicamente a premissa daquele livro, muito embora a adaptação cinematográfica dele tenha sido tão tosca.



"Como Treinar o seu Dragão" (o filme) conseguiu traduzir essa relação de sonho para a telona com maestria, justamente por construir toda a história ao redor de Soluço e Banguela, sem ficar distraído com qualquer outro aspecto da ficção de Berk. A introdução aos personagens, por exemplo, acontece de forma rápida e contínua, explicando em poucas cenas e palavras tudo o que se precisa saber sobre Soluço, Stoico, todos os vikings de Berk e sua mentalidade sobre os répteis voadores. Em dez minutos de filme, já estamos devidamente escolados no enredo para presenciarmos o primeiro encontro entre o menino e o dragão, e todo o resto do filme se desenrola na construção e fortificação do relacionamento - LINDO, LINDO - dos dois.

Nesse processo, tudo ajudou. O gráfico do filme é um 3D fofinho, sem pretenções de manter as imagens na proporção da realidade, mas não tão disforme a ponto de dar aquela sensação de que estamos vendo alienígenas. Confesso que, quando vi as primeiras stills do CG do Banguela, fiquei muito incrédula. No entanto, quebrei completamente a minha cara quando vi o dragãozinho se movendo e sendo fofo na tela, admito sem vergonha. Ele tem uma textura fofinha de bichinho de pelúcia, mas os olhos são grandes e tão EXPRESSIVOS que fazem o telespectador levar o personagem a sério desde o primeiro momento.

A música também é quase um personagem próprio nesse filme. Todos vocês vão ficar com vontade de adquirir a trilha sonora de John Powell assim que terminarem os créditos finais. Ela é cheia de flautas e gaitas de fole, ao estilo folk, e combina totalmente com a história. Uma das faixas, chamada "Forbidden Friendship", embala um momento crucial (e bem óbvio, né, se você entendeu o nome da música) de uma forma que me fez ganhar um respeito ainda maior por qualquer ganhador de Oscar por trilha sonora.

Nossa, eu estou sendo muito parcial, não estou? Vou terminar logo esse texto antes de começar a babar no teclado, ou de parar no meio para ir assistir o filme. De novo.

O LADO BOM

Tudo.

Okay, deixa eu listar, né.

1. Adaptação super bem-feita, a ponto de eu considerar até melhor do que o livro (!!!). O roteiro foi cuidadoso e deixa aquela vontade de bater palmas em muitos momentos.
2. Personagens cativantes. TODOS eles.
3. Gráficos estonteantes. Olha, tem uma cena de por do sol + passeio no cangote do dragão lá que é simplesmente de babar. Mesmo o aspecto infantil dos humanos e dos dragões não diminuiu a beleza do filme.
4. A música é perfeita. Sério, eu escuto o CD da OST todo dia, geralmente antes de dormir.
5. Faz algum tempo que eu venho perdendo minha fé na dublagem brasileira, mas sabe a dublagem desse aqui? Impecável. Todas as adaptações são válidas, todas as vozes foram bem escolhidas, a sincronização é muito bem feita. Faz até eu esquecer que não estou ouvindo a voz de veludo do Gerard Butler como Stoico.
6. Vaza sarcasmo desse filme em doses saudáveis e de bom gosto.
7. A história é para todas as idades: meu irmão de quatro anos até hoje finge ser um Fúria da Noite enquanto corre pela sala, e a minha mãe, de quase cinquenta anos, assistiu o filme sozinha no meu computador mesmo depois do meu já mencionado irmão trocá-lo por um episódio de Ben 10 do Cartoon. E eu juro que vi os olhos dela brilharem nas partes emocionantes.


O LADO RUIM

Tive que me esforçar bastante nesse, mas tentei ser realista:

1. O filme realmente mudou bastante da história. Não desnaturalizou a ideia geral da coisa, mas operou mudanças grandes o bastante para ser considerado um Universo Alternativo.
2. O fato da Astrid ter sido criada talvez crie alguns problemas com as continuações que DreamWorks já está fazendo.
3. Eu ainda não assisti os websodes extras! Certo, isso não é uma coisa ruim para o filme; mas é ruim para mim, tá legal?

CONCLUSÃO

Recomendado. Se é que minha total falta de impacialidade não foi uma indicação. E para aqueles que não se contentam em assistir só o filme, visitem também o Tumblr dos produtores do filme, com character designs, stills e textinhos legais; tem também o site oficial, que é muito legal (quero dizer, eles fizeram um show com dragões em tamanho real baseado nesse filme! Quão legal isso é?).

E para saber sobre os livros, vejam as resenhas da Camila: aqui e aqui!

Larissa

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